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Governo corta R$ 5,7 bi e atinge Farmácia Popular, Auxílio Gás, PF, Exército e obras em rodovias

07 de junho de 2024
Fonte: Jornal O Estado de S. Paulo

Ministério do Planejamento afirma que tesourada não compromete políticas públicas ou atividades, mas órgãos contestam; gastos com Previdência, por outro lado, aumentaram R$ 13 bi.

BRASÍLIA – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cortou R$ 5,7 bilhões em despesas não obrigatórias no Orçamento neste ano, atingindo órgãos como Receita Federal, Polícia Federal e Exército, verbas do programa Farmácia Popular, ensino integral e Auxílio Gás e obras em rodovias federais, entre outras. Por outro lado, o crescimento da demanda por benefícios previdenciários levou o Executivo federal a aumentar em R$ 13 bilhões a previsão para o pagamento de aposentadorias, pensões e outros benefícios do INSS no ano.

Os cortes incluem os gastos que passaram por revisão após o resultado da inflação de 2023, conforme exigido pelo arcabouço fiscal, e outras despesas que foram reduzidas ao longo deste ano e que não tiveram o dinheiro reposto até agora, de acordo com levantamento feito pelo Estadão com dados do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), do governo federal, e do Siga Brasil, mantido pelo Senado.

Procurado, o Ministério do Planejamento e Orçamento afirmou que houve um ajuste de R$ 4,1 bilhões em março em despesas que estavam condicionadas ao resultado da inflação efetiva em 2023 e que foram retiradas após apuração do índice. Em abril e maio, a pasta alegou cancelamento a pedido dos ministérios afetados e por decisão governamental. “Em todas essas ocasiões, os órgãos argumentaram que os cancelamentos não trariam prejuízo à execução de suas políticas públicas ou atividades.” Os órgãos, porém, contestam.

O programa Farmácia Popular teve redução de R$ 185 milhões no sistema de gratuidade e R$ 107 milhões no sistema de co-pagamento.

A situação mostra que a pressão das despesas obrigatórias, como aposentadorias e pensões, sobre o Orçamento e o efeito nas verbas de manutenção dos órgãos e serviços públicos e nos investimentos não é um problema endereçado para o futuro, mas já é realidade.

Os números também evidenciam que o espaço adicional permitido pelo arcabouço fiscal neste ano, de R$ 15,8 bilhões, já foi consumido, considerando o aumento dos gastos obrigatórios e a derrubada de vetos às emendas de comissão.

O corte mais expressivo foi na manutenção administrativa de diversos órgãos federais, que tiveram redução de R$ 799,6 milhões. Foram 83 instituições afetadas, incluindo Receita Federal, Polícia Federal e Exército. O Exército afirmou que o corte impacta o planejamento estratégico realizado pela Força. “Os principais reflexos estão na sustentabilidade dos materiais de emprego militar existentes e na administração e no funcionamento das Organizações Militares”, disse a instituição.

A Polícia Federal disse à reportagem que, em comparação com 2023, a redução é ainda maior, superior a R$ 200 milhões. “Este fato poderá impactar diversas atividades do órgão, como a realização de investigações e operações, a execução dos trabalhos de polícia judiciária e administrativa, a segurança das reuniões do G20, as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras, emissão de passaportes e mesmo a manutenção de serviços básicos, como o pagamento de aluguéis e o abastecimento de viaturas”, disse a PF. A instituição pediu recomposição ao Ministério do Planejamento e ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, à qual é vinculada.

O programa Farmácia Popular, que fornece medicamentos gratuitos e descontos para a população mais pobre, teve redução de R$ 185 milhões no sistema de gratuidade e R$ 107 milhões no sistema de co-pagamento. A implantação de escolas em tempo integral, programa prioritário do Ministério da Educação, perdeu R$ 165,8 milhões. O Auxílio Gás, que paga o botijão de gás de cozinha para famílias carentes, sofreu corte de R$ 69,7 milhões.

O Ministério da Saúde afirmou que o programa Farmácia Popular saiu de um orçamento limitado a R$ 1 bilhão em 2022 para R$ 5,4 bilhões em 2024. “Em que pese a redução de recursos, isto não impacta no planejamento do ministério de imediato, tendo em vista que, ao longo do exercício financeiro, estes recursos poderão ser reestabelecidos e o planejamento anual ser executado de forma adequada.”

Economistas alertam para crescimento das despesas com Previdência Social

Em maio, o governo aumentou o orçamento dos benefícios previdenciários para 2024 em R$ 13 bilhões. De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), houve concessão de 654.021 novos benefícios no mês anterior, incluindo auxílio-doença, salário-maternidade, aposentadoria, pensões e Benefício de Prestação Continua (BPC, concedido a pessoas idosas e com deficiência), que demandaram o acréscimo.

Os benefícios previdenciários são reajustados pelo salário mínimo. A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, chegou a propor a desvinculação. Em entrevista ao Estadão, porém, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que não vê “muito espaço” para essa discussão.

O Ministério do Planejamento afirmou que as despesas com a Previdência Social aumentaram após aprovação do crédito de R$ 15,8 bilhões do arcabouço pelo Congresso e da reavaliação de despesas feitas pelo Executivo em maio, em função da concessão de benefícios. De acordo com o ministério, o corte nas despesas discricionárias (não obrigatórias) não serviu para aumentar o valor nas obrigatórias.

Em maio, o governo conseguiu um recurso extra de R$ 15,8 bilhões, autorizado pelo arcabouço fiscal, e anunciou o desbloqueio de despesas no Orçamento, mas não recompôs recursos que foram efetivamente cortados do caixa.

O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, afirma que os gastos previdenciários pressionam cada vez mais o Orçamento, exigindo corte nos investimentos e na manutenção de órgãos e serviços públicos. “Se o governo não começar atacando o problema previdenciário para valer, vai continuar dando voltas“, afirma.

“Hoje, o que ele faz é apertar quem já está apertado, que são os gastos discricionários, e parte da conta está sendo paga pelo encolhimento dos investimentos em infraestrutura, sem os quais a economia não cresce.” Velloso defende uma nova e profunda reforma da Previdência, com revisão de regras e implantação de um sistema de capitalização.

Para Felipe Salto, economista-chefe e sócio da Warren Investimentos e ex-secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, as despesas com Previdência estavam subestimadas no Orçamento de 2024 – o que exigiu a revisão pelo governo federal –, e novos aumentos estão no horizonte.

“As despesas estavam subestimadas. Isso era pedra cantada, menos de R$ 910 bilhões na LOA (Lei Orçamentária Anual). Agora, estão correndo atrás do prejuízo para cobrir a subestimativa e dar conta de todos os pagamentos. Despesa obrigatória tem de ser paga. Não tem escapatória.”

Ele afirma que as pressões de gastos eram “muito maiores do que o espaço aberto” com o crédito extra permitido pelo arcabouço. “Só com a Previdência, nas minhas contas, o governo deveria revisar o gasto para pelo menos R$ 932,5 bilhões”, diz Felipe Salto. A última estimativa do Executivo, porém, é de R$ 917,8 bilhões. O economista defende desvinculação dos pagamentos ao salário mínimo e corte em outras despesa da União.

PAC é afetado por cortes e emendas ficam blindadas

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), outra vitrine do governo Lula, não foi poupado. Um conjunto de 12 obras em rodovias federais teve 100% do recurso retirado do Orçamento, incluindo a construção da contorno rodoviário em Cuiabá, nas BRs 070, 163 e 364, e a construção de trechos rodoviários, no Piauí, em Pernambuco, na Bahia, em Minas Gerais e em Mato Grosso do Sul.

De acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), o cancelamento foi um remanejamento feito pelo órgão “com o objetivo de otimizar a alocação de recursos, sem qualquer prejuízo para os empreendimentos rodoviários federais em execução”. Outras obras foram contempladas com acréscimo de recursos e, de acordo com o DNIT, o orçamento total da autarquia não sofreu redução.

Em meio aos cortes, as emendas parlamentares foram blindadas. A legislação aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Lula blinda os recursos indicados por deputados e senadores, que não podem ser reduzidos pelo governo e precisam ser liberados de acordo com a vontade dos parlamentares. As despesas afetadas são aquelas que ficam sob controle direto do Executivo federal.

Nesta semana foi lançado A Reforma Inacabada, da dupla Fabio Giambiagi e Paulo Tafner, especialistas em Previdência. Grande parte de suas ideias esteve na base da reforma aprovada em 2019. O impacto nas contas públicas é importantíssimo, mas foi a ênfase na desigualdade entre diferentes regimes que permitiu o avanço das discussões. Sem a promessa de atacar privilégios, tema sempre tão polêmico aqui e no mundo, não teria avançado.

A reforma veio mais tímida que o desenho inicial. Desde o início era sabido que a economia gerada não era suficiente e uma nova rodada seria necessária.

Só não se esperava que voltasse à agenda econômica tão cedo. Não poderia ser diferente para um governo, como o atual, que acredita no gasto público como motor de crescimento. Enquanto heterodoxos colocam a raiz do problema nos juros, os que levam política fiscal a sério buscam alternativas de corte de gastos mais permanentes.

A rigidez orçamentária impõe limites à melhor racionalização de despesas no curto prazo.

Uma criteriosa revisão de despesas vem sendo feita no Ministério do Planejamento.

Elena Landau: Quanto mais se gastar com a Previdência, menos espaço haverá no Orçamento para gastos sociais mais eficientes.

Excelente para tornar a máquina pública mais eficiente, mas dificilmente vai gerar ganhos em montantes suficientes para impactar a trajetória da dívida pública. Entre suas tarefas está o corte em gastos tributários que chegam a meio trilhão de reais.

Mas não há força política para enfrentar absurdos como a Zona Franca de Manaus, talvez o maior exemplo de regressividade e ineficiência no uso de escassos recursos públicos.

Novamente, a motivação para se discutir ajuste na Assistência Social e Previdência não é apenas o ganho fiscal no curto prazo. Qualquer mudança nos critérios de benefícios levará tempo para surtir efeito. Sempre enfrentará resistências, pois vai repensar benefícios para mulheres, professores e aposentaria rural, entre outros. Mas Previdência não é o instrumento de compensação à ausência de políticas públicas para tratar de questões derivadas da desigualdade.

E, quanto mais se gastar com ela, menos espaço haverá no Orçamento para gastos sociais mais eficientes. Ainda será necessário introduzir novas regras que acompanhem um mundo em rápida transformação; desde o envelhecimento da população às novas formas de trabalho. E, com avanço da IA, não se sabe o que será do amanhã.

O livro é didático e percorre todo o caminho necessário para uma reestruturação profunda na nossa Previdência. Não é preciso ser especialista no assunto. Vale a leitura.

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