Nova precificação de remédios destrava inovação
16 de junho de 2025Farmacêuticas afirmam que as regras atuais, por concentração do princípio ativo, não incentivam modernização de produtos.
Por Ana Luiza de Carvalho — De São Paulo
As mudanças no arcabouço regulatório que define os preços dos medicamentos no Brasil podem desbloquear até R$ 5,2 bilhões em investimentos na indústria nacional, segundo empresários do setor. Os números, divulgados pela Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais (Alanac) com exclusividade ao Valor, consideram que os preços dos medicamentos não serão mais diretamente relacionados à concentração do princípio ativo nos casos de inovação incremental, quando uma empresa lança uma nova tecnologia para um composto já existente.
A Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed), entidade subordinada à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), vai recolher sugestões de mudanças nas regras em uma consulta pública até o dia 10 de julho.
O presidente da Alanac, Henrique Tada, aponta que o desenvolvimento de uma nova tecnologia pode melhorar a absorção do medicamento e, consequentemente, exigir uma menor dosagem do composto ativo. É o que acontece quando um fármaco em comprimido recebe uma versão injetável, por exemplo.
O impasse, segundo Tada, é que um medicamento mais moderno pode ter um preço inferior à versão já vendida no mercado, considerando que um dos critérios da Cmed para definir o preço de novos produtos é a miligramagem do composto ativo. No cenário atual, de acordo com o executivo, as empresas nacionais deixam de investir pelo menos R$ 5 bilhões em inovação incremental.
“Esse é um valor estimado de projetos que foram abandonados. O valor real pode ser bem maior. Além disso, a inovação incremental pode ampliar o faturamento das empresas e viabilizar a inovação radical, que é ainda mais custosa”, afirma ao Valor
A secretaria-executiva da Cmed, Daniela Marreco, explica que os preços de novos medicamentos são definidos por referências externas e internas. A referência externa é composta por um rol de uma dezena de países e, segundo a Cmed, o preço estabelecido no Brasil não pode ficar acima do menor preço praticado na cesta de países.
Já a referência interna compara o custo de tratamento do novo medicamento em relação a outros já disponíveis no mercado para tratar a mesma doença ou condição. A definição não tem uma fórmula matemática definida, como o estabelecido pela Cmed para o reajuste anual.
O cálculo é mais complexo e considera a inflação acumulada nos doze meses anteriores e as estimativas de ganhos futuros de produtividade das empresas que compõem a indústria farmacêutica, chamados de Fator X, Fator Y e Fator Z, respectivamente.
Pela regra vigente, pode acontecer descompasso de preços entre a forma antiga e a nova forma”. — Daniela Marreco.
De acordo com a secretária-executiva da Cmed, o ponto de impasse apontado pela indústria no caso da inovação incremental é relacionado ao critério de custo do tratamento, que inclui a dosagem de referência para o tratamento de uma doença. “Pela regra vigente, pode acontecer esse descompasso de preços entre a forma antiga e a nova forma, se tiver o desenvolvimento de uma nanotecnologia, por exemplo. A proposta nova terá regras específicas para registro de inovação incremental e isso não vai mais acontecer”, diz.
A inovação incremental, porém, nem sempre representa a adaptação de um comprimido para um medicamento injetável - às vezes a novidade é justamente o caminho contrário. É o caso do comprimido de semaglutida Rybelsus, lançado pela Novo Nordisk anos após o sucesso das canetas injetáveis Ozempic. A dose de 0,25 miligrama da caneta é equivalente ao comprimido de 3 miligramas de semaglutida, considerando que cerca de 2,5 miligramas do composto ativo são perdidos durante a ingestão do medicamento.
A diretora da área médica da Novo Nordisk, Marcela Caselato, diz que o tratamento da diabetes - primeiro com a insulina e recentemente com os chamados análogos do GLP-1- sempre foi feito a partir dos hormônios em forma injetável. O incômodo de parte dos pacientes com as picadas e o risco de abandono do tratamento, porém, levaram a farmacêutica dinamarquesa a transformar o Ozempic em um remédio oral.
“Nós sempre vimos nas pesquisas de mercado e nas conversas com a comunidade médica de que a injeção representava uma barreira para o tratamento. Pensando nessas necessidades, nós demos início às pesquisas e depois de muitos anos de estudo conseguimos criar uma tecnologia chamada snack que altera a acidez do estômago e permite a absorção rápida da proteína antes que ela se degrade completamente”, afirma ao Valor.
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