Veja por que brasileiro está menos disposto a gastar que americanos e europeus
27 de fevereiro de 2024Por Luiz Fernando Figliagi — De São Paulo
Pesquisa revela que cerca de 80% querem reduzir os gastos, acima da média mundial.
A população brasileira está mais cautelosa na hora de consumir. A maioria prefere reduzir os gastos do dia a dia para as contas fecharem no fim do mês, revela pesquisa exclusiva da Bain & Company.
O resultado no Brasil acompanha a tendência mundial, mas os brasileiros se mostraram menos dispostos a gastar que americanos e europeus. Os autores do levantamento atribuem essa tendência a um cenário mundial mais turbulento e percepção de custo de vida mais elevado.
A pesquisa revelava que, em novembro de 2022, 86% dos consumidores pretendiam cortar gastos. No mesmo período de 2023, 80% dos brasileiros apontavam que pretendiam diminuir o consumo. Nos Estados Unidos, 53% dos consumidores planejavam redução nos gastos e na Europa, 54% das pessoas falavam em corte de gastos.
“A gente vê que na Europa e nos Estados Unidos, quando pegamos os resultados da pesquisa de 2023, o número já está bem menor que 2022. Percebemos que nos mercados envolvidos já há uma tendência de certa recuperação no nível de gastos que não vemos na pesquisa do Brasil. O resultado está um pouquinho melhor que o ano passado, mas marginalmente”, destaca o sócio e líder de bens de consumo da Bain na América do Sul, Ricardo De Carli.
“Comparado com 2022, a gente perguntou para os consumidores se eles estavam ativamente reduzindo os gastos e se eles mantinham o mesmo padrão ou se eles pretendiam aumentar o padrão de gastos em 2023. Tanto em 2023 quanto em 2022, a proporção de consumidores que disse que continuará apertando os cintos e pretendendo gastar menos é super alta”, diz De Carli.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram o contrário: em 2022 o consumo das famílias subiu 4,3% e no terceiro trimestre de 2023 1,1%. De Carli explica que a pesquisa não pretende quantificar o impacto esperado no consumo das famílias, mas avaliar apenas a intenção dos consumidores.
“Sob esta ótica, mesmo quando há evolução no consumo, o que notamos, ano após ano, é a manutenção de um elevado nível de preocupação do brasileiro em patamares superiores ao de consumidores nos mercados desenvolvidos. A pesquisa mostra que 80% ainda afirmam que planejam cortar gastos, muitas vezes em itens básicos como alimentação ou energia, e o nível de ansiedade permanece em patamar elevado. Apesar disso, o consumidor brasileiro segue confiante no futuro, com cerca de 50% deles acreditando que o Brasil estará melhor em 5 anos”, destaca.
Esse sentimento de cautela apresentado no estudo, está ligado à renda das famílias e ao aumento significativo nos preços de setores da economia. Enquanto pessoas de baixa renda estão mais preocupadas em reduzir custos de energia e alimentos, os mais ricos procuram economizar mais em delivery, restaurante e saídas de casa, aponta o sócio da Bain. “É algo que a gente já enxerga um pouco desde a pandemia”, diz.
A redução no Brasil é maior nesses tipos de serviço e produtos: energia elétrica (27%), mantimentos (26%), roupas pessoais (24%), delivery de comida (23%), restaurantes (22%) e cuidados pessoais (17%).
Na Europa, o foco muda, e 47% dos consumidores falam em cortar gastos em restaurantes e cafés, 40% em bebidas alcoólicas em bares e 37% falam em reduzir compras de roupas. No caso dos americanos, 46% pretendem cortar em restaurantes e cafés, 44% dizem diminuir gastos com delivery, e 37%, em roupas pessoais.
Sobre os principais objetivos para 2024, os consumidores de baixa renda demonstram que a estabilidade no emprego e o desejo de poder gastar mais são prioridades. Para os de alta renda, viajar e a família são assuntos prioritários. O tema da saúde é um ponto em comum em todas as faixas.
Joelson Sampaio, economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), explica que o superendividamento das famílias brasileiras faz com que elas consumam menos.
“Tivemos no pós-pandemia um aumento do endividamento das famílias. Hoje o Brasil passa por esse problema do superendividamento. As famílias têm uma capacidade de consumo reduzida porque elas acabam tendo problemas em honrar os compromissos financeiros e acabam comprometendo uma boa parte do orçamento. Esse contexto leva os brasileiros a ter mais cautela no seu consumo”, explica.
Sobre os números do IBGE, Sampaio explica que os dados têm uma visão mais macro, enquanto a pesquisa tem um olhar mais microeconômico.
“O superendividamento causou a queda na renda por causa da pandemia, já o aumento do consumo é a melhora da economia”, explica. No caso, tivemos um PIB bem positivo ano passado, que foi acima do esperado. O que teremos daqui em diante é essa trajetória de recuperação que pode permanecer por mais tempo e isso acaba explicando esse consumo mais positivo. A cautela tem uma relação com o superendividamento e com as memórias que as famílias tiveram durante a pandemia.”
A pesquisa também revela níveis de preocupação do consumidor em temas variados. Cada assunto é medido em uma escala de 1 a 5 e aborda questões como política, economia, meio ambiente e saúde. O nível médio de preocupação no Brasil é de 3,76 e nos EUA e Europa, respectivamente, 3,20 e 3,37 - na América Latina o índice é maior: 3,85.
Contexto de endividamento faz as famílias serem mais cautelosas — Joelson Sampaio
Quando a abordagem analisa a confiança dos consumidores em diferentes instituições - usando a mesma escala que mede as respostas de 1 a 5 -, o brasileiro se mostra mais confiante que outras nacionalidades.
A credibilidade do governo federal (3,06) no Brasil também é maior do que a de poderes executivos de outras regiões analisadas pelos pesquisadores. Europa apresenta uma confiança de 2,85, EUA 2,97, e América Latina, 3,17.
A confiança do brasileiro aumenta em governos locais (3,16) e na polícia (3,33). Nos EUA, na média, 3,23 confiam no poder local e 3,51 na polícia. Na Europa os dados de confiança na polícia são altos: 3,57 e 3,01 acreditam em políticos locais.
Na América Latina, a confiança na polícia é de 3,20, em governos locais e federais, 3,16 e 3,06, respectivamente.
Os brasileiros também confiam mais em grandes empresas de tecnologia (3,69), conteúdo nas redes sociais (3,24) e grandes mídias tradicionais (3,19), do que as regiões apresentadas.
Na América Latina a confiança em companhias de tecnologia é de 3,56, redes sociais, 3,18, e, na mídia, 3,08. Na Europa, a credibilidade para o setor de tecnologia é de 3,06, em redes sociais, 2,73, e na imprensa tradicional, 2,98.
Nos Estados Unidos, o nível médio de quem confia em empresas de tecnologia fica em 3,10, para os conteúdos on-line, 2,79, e na mídia tradicional, 3,02.
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